A realidade sacramental da Igreja é precedida na história por seu modelo profético: a Lei Mosaica.
Nela vemos (Levítico, capítulos 4 e 5) que Deus exigia um sacrifício cerimonial pelos pecados ofendidos. O sacrifício se realizava no Tabernáculo (posteriormente no Templo) e diante dos sacerdotes, o que em si era uma admissão pública do pecado.
O exercício destas cerimônias não apenas era público, como também ensinava ao povo a inevitável conseqüência do pecado: a morte.
O animal que era sacrificado morria em lugar do pecador.
O modo de execução desses sacrifícios era inevitavelmente um equivalente ao Sacramento da Reconciliação, em que tanto o sacerdote quanto o fiel tinham [e têm] uma participação claramente definida.
“Se for alguém do povo quem pecou involuntariamente, cometendo uma ação proibida por um mandamento do Senhor, tornando-se assim culpado, trará para sua oferta uma cabra sem defeito, pela falta cometida, logo que tiver tomado consciência de seu pecado. Porá a mão sobre a cabeça da vítima oferecida pelo pecado e a imolará no lugar onde se imolam os holocaustos. Em seguida, o sacerdote, com o dedo, tomará o sangue da vítima, e pô-lo-á sobre os cornos do altar dos holocaustos, derramando o resto ao pé do altar. Tirará toda a gordura, como se fez no sacrifício pacífico, e a queimará no altar, como agradável odor ao Senhor. É assim que o sacerdote fará a expiação por esse homem, e ele será perdoado. Se for um cordeiro que oferecer em sacrifício pelo pecado, oferecerá uma fêmea sem defeito. Porá a mão sobre a cabeça da vítima oferecida pelo pecado e a imolará em sacrifício de expiação no lugar onde se imolam os holocaustos. Em seguida, com o dedo, tomará o sacerdote o sangue da vítima oferecida pelo pecado, e o porá sobre os cornos do altar dos holocaustos, derramando o resto do sangue ao pé do altar. Tirará toda a gordura como se tirou a do cordeiro do sacrifício pacífico, e a queimará no altar, entre os sacrifícios feitos pelo fogo ao Senhor. É assim que o sacerdote fará a expiação pelo pecado cometido por esse homem, e ele será perdoado” (Levítico 4,27-35).
É importante esclarecer ainda que a confissão auricular, com o passar do tempo, se desenvolveu em sua forma exterior até atingir a forma como a conhecemos hoje. Mas veremos que sua essência encontra-se no fato reconhecido da reconciliação do pecador se dar por intermédio da autoridade da Igreja.
E esse fato faz parte do legado da Igreja, existindo desde o momento em que Cristo outorgou referido poder aos Apóstolos. Comprovaremos que a disciplina penitencial, inclusive a confissão dos pecados diante do sacerdote e da Igreja, existe deste a Era Apostólica. Examinemos a Didaqué (redigida entre 60 e 160 d.C.), considerada um dos mais antigos escritos cristãos não-canônicos e que pode anteceder boa parte dos escritos do Novo Testamento, já que estudos recentes apontaram que a data possível de sua composição é anterior ao ano 160 d.C.
Trata-se de um excelente testemunho do pensamento da Igreja primitiva. Referido documento é insistente em exigir a confissão dos pecados antes do recebimento da Eucaristia:
“Na reunião dos fiéis, confessarás os teus pecados e não te aproximarás da oração com má consciência”[14].
Na Didaqué temos, então, um antiquíssimo testemunho histórico que se opõe à posição protestante de confessar os pecados diretamente a Deus.
A faculdade que a Igreja tem para conceder em nome de Deus o perdão dos pecados provém do próprio Cristo, que conferiu esta faculdade aos seus Apóstolos quando disse-lhes:
“A paz esteja convosco. Assim como o Pai me enviou, eu também vos envio”.
Após dizer isto, soprou sobre eles e lhes disse:
“Recebei o Espírito Santo. Aqueles a quem perdoardes os pecados, estes serão perdoados. Aqueles a quem os retiverdes, estes serão retidos”(João 20,19-22].
Disse ainda a Pedro: “Eu te darei as chaves do Reino dos Céus e tudo o que ligares na terra será ligado nos céus; e o que desligares na terra será desligado nos céus”[4]; e também aos Apóstolos: “Eu vos asseguro: tudo o que ligares na terra será ligado no céu; e tudo o que desligares na terra será desligado no céu”[5].
O significado de ligar e desligar não se limita à autoridade de definir o que é lícito e o que não é no tocante a doutrina, mas também a faculdade de conceder o perdão dos pecados, já que o poder outorgado aqui não é limitado: “TUDO o que ligares”, “TUDO o que desligares”. Esse poder, por sua vez, é confirmado explicitamente por Cristo ao permitir ou reter os pecados.
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