Nós encontramos, na história, vários codificadores de teorias. E teoria segundo o Aurélio, é o conjunto de princípios fundamentais de uma arte ou ciência. No caso do espiritismo, de uma ciência. Marx codificou as teses socialistas, Adam Smith, as capitalistas; Carles Darwin, as evolucionistas; Allan Kardec, as espiritistas. Cada um no seu campo específico.
Allan Kardec, por exemplo, preocupado com a vida após a morte, defendia a tese da reencarnação, fundado num princípio de “nova chance”, talvez preocupado com a condenação eterna. Foram muitos os seus seguidores e, principalmente no Brasil, o espiritismo assumiu características de religião. E o vasto tempo de apologética da Igreja Católica contribuiu para isso. Daí os espíritas terem sido estimatizados pelos católicos como hereges.
No meu ponto de vista, três coisas devem ser consideradas. Primeiro, que toda religião tem doutrina e culto. O espiritismo tem doutrina e não tem culto. Daí ser uma teoria e não uma religião. Basta ver que os espíritas estão mais ligados à Igreja Católica. Dificilmente se encontra um espírita evangélico, isto é, protestante. Eles fazem questão de batizar os filhos na Igreja Católica, casar na Igreja Católica e chegam até a encomendar missa de sétimo dia, na Igreja Católica, para os familiares falecidos.
Em segundo lugar, o que leva uma pessoa a ser espírita? São várias as razões: uns, por tradição: os pais são espíritas, os avós foram espíritas. Outros porque procuram respostas imediatas para questões insolúveis: a morte, por exemplo. Quando uma “alma” envia mensagens, ela, de certa forma, alivia o sofrimento dos que ficaram. Se um filho que perdeu a mãe, indo ao centro espírita julga que se “comunica” com ela, isso serve de alívio para ele.
E, em terceiro lugar, onde o espiritismo se desenvolveu? Nos países subdesenvolvidos. Não se fala de espiritismo, por exemplo, na Europa. Lembro-me que, uma vez, numa visita as limina, visita que os bispos fazem ao Papa, um bispo brasileiro tentava falar do crescimento do espiritismo no Brasil. E o Papa não conseguia entender o que era espiritismo de que o bispo falava. É de certa forma, o “animismo” que caracteriza o “africanismo” e seus cultos.
A única coisa que, no espiritismo contraria a Igreja Católica é a teoria da reencarnação. Isso porque ‘bate de frente’ com a fé na ressurreição. Eu chamaria isso de “atalho”. E o que é um “atalho”? o dicionário vem em nosso socorro: “caminho que encurta a distância entre dois pontos”. No mundo moderno temos muitos atalhos: o quebra-molas, por exemplo. É mais fácil colocar um obstáculo na estrada do que educar para o trânsito; o preservativo: é mais fácil recomendar o seu uso do que promover uma educação para a castidade. Assim, a reencarnação: é mais fácil “dar uma chance’ à alma penada do que exigir dela, em vida, uma conversão.
Outro aspecto relevante no espiritismo é a caridade. Os espíritas são caridosos, isto é, promovem a caridade como forma de purificação. Basta ver o exemplo de Chico Xavier. Inúmeras foram as obras de caridade por ele sustentadas. Apesar do seu “status” de médium famoso, procurado por tanta gente, viveu e morreu pobre. Talvez tenha sido esta a ‘isca” para atrair tantos admiradores. Com certeza, foi isso que fez dele o ‘papa” do espiritismo.
Espiritismo: teoria ou religião? Para mim, perguntar se um espírita pode ser católico é o mesmo que perguntar se um evolucionista ou capitalista também pode. Ou, para ser mais radical, um corintiano pode ser católico? Ou, então, um católico pode ser corintiano? Não só pode, como deve.
Dom Paulo Sérgio Machado
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