Como batizados, fazemos parte do Corpo Místico de Cristo, cuja unidade espiritual entre os fiéis é professada pelo artigo “creio na comunhão dos santos” contido no Símbolo dos Apóstolos (Credo). Há uma intercomunhão entre todos os fiéis, vivos e mortos, uma solidariedade espiritual, comunhão esta que é um reflexo da “pericorese trinitária” (a intercomunhão entre as Pessoas da Ssma. Trindade). Desta forma os que estão junto à glória de Deus (Igreja Triunfante) – ditos santos ou bem-aventurados, intercedem e socorrem a nós que ainda peregrinamos por esta vida (Igreja Militante). Por sua vez a Igreja pede a Deus e nós com ela (o que vem a ser uma obra de misericórdia espiritual; CIC 2447), que conceda sufrágio aos fiéis que partiram desta realidade terrena, mas que ainda necessitam de uma “purificação” (Igreja Padecente), devido às suas limitações e apegos às coisas transitórias, para então chegarem à perfeição (cf. Mt 5,25-26;18, 23-35). Os méritos de cada bem realizado, como também a eficácia das orações, se difundem por todo esse Corpo Místico chegando a todos os seus membros, graças à ação do Espírito Santo.
Por esta comemoração litúrgica, a Igreja chama a nossa atenção para o que dizia São Paulo Apóstolo, “não queremos, irmãos, deixar-vos na ignorância a respeito dos mortos, para que não vos entristeçais como os outros que não tem esperança” (1 Tes 4, 13). É uma data importante não somente para recordar e rezar pelo descanso de nossos entes queridos que já partiram dessa nossa realidade terrena, mas para também para refletir sobre as realidades futuras que nos aguardam (os novíssimos: a morte; o juízo, o purgatório, a visão beatífica, a ressurreição etc.). Pois temos consciência de que “nossa morada terrestre, que não passa de uma tenda, vem a destruir-se, nós temos um edifício, obra de Deus, uma morada eterna nos céus… pois nós caminhamos pela fé… estamos cheios de confiança e preferimos deixar a morada deste corpo para ir morar junto do Senhor” (II Cor 5,1. 7-8).
No “decálogo”, encontramos no quarto mandamento a ordem de honrarmos aos pais e mães (cf. Ex. 20,12; Dt 5, 16), ora a morte não extingue tal preceito, ainda mais para um cristão, basta recordarmos a exortação do autor da Carta aos Hebreus de não nos esquecermos os que nos legaram a Palavra e de imitá-los na fé (cf. Hb 13,7). O respeito pelos que partiram dessa nossa realidade é um elemento comum a todas as culturas e em todas as épocas. É algo eminentemente humano, assim a Sagrada Escritura não poderia estar alheia a isso, uma vez que é uma obra de parceria entre Deus que inspira e o homem que a transcreve através de suas experiências com esse Deus que foi se revelando. Se amamos nossos pais, tanto os biológicos, quanto aos espirituais, bem como aos nossos parentes e amigos, em sua existência entre nós, deixaríamos de amá-los após a sua morte? Se a eles damos atenção e carinho, além de rezamos por sua saúde, trabalho e felicidade terrena, que são transitórias, porque não rezaríamos por seu descanso e felicidade eterna?
Tal celebração da memória de nossos falecidos tem sua fundamentação na própria Sagrada Escritura. Quando da morte de Aarão, Moisés e toda a Comunidade de Israel, juntamente o prantearam (cf. Nm 20,28-29). Os israelitas guardaram um luto de trinta dias pela morte de Moisés (cf. Dt. 34,5-8). Todo o Israel se reuniu para os funerais do profeta Samuel (cf. I Sm 25,1). Mas dos escritos veterotestamentários é no livro de II Macabeus onde vemos que juntamente com o pranto e o luto, o povo da Antiga Aliança oferecia súplicas a Deus em sufrágio por seus mortos (cf. II Mac 12). O que ainda ocorre na tradição judaica com a “oração de kadish” pelos entes falecidos rezadas em seus ofícios litúrgicos.
Sendo o cristianismo herdeiro da revelação veterotestamentária, agora compreendida a luz da auto-revelação de Jesus Cristo, encontra-se também no Novo Testamento várias referências a celebração dessa memória pelos entes falecidos. O próprio Jesus chorou a morte de Lázaro, um ato que comoveu aos presentes (cf. Jo 11, 33- 38). Os discípulos de Jesus prantearam sua morte (cf. Mc 16,10). Assim é provável que a Comunidade primitiva tenha também guardado luto pelas mortes de Estevão e de Tiago (cf. At, 7, 59-60; 8,2; 12, 1-12). Na Igreja Primitiva, por causa das perseguições, muitas vezes os cristãos falecidos eram sepultados sem o ritual de exéquias, a Comunidade se reunia dias depois, ao sétimo ou trigésimo dia para junto ao túmulo rezar pelo falecido e consolar seus familiares. Havia a prática de celebrar a Eucaristia junto ao túmulo dos mártires (muitos enterrados em catacumbas) ou no local de seu martírio, disso talvez disso tenha surgido a tradição de visitar os cemitérios nessa data.
Comparando os versículos 15 a 18 do capítulo I dessa epístola, com o versículo 19 do capítulo IV da mesma carta, vê-se que Onesíforo já era morto, porque nesses textos o Apóstolo se refere nominalmente a outras pessoas, e quando seria o caso de nomear Onesíforo, seu grande amigo e benfeitor, ele não o faz, mas só se refere “à família” de Onesíforo. Dai se conclui que ele não era mais do número dos vivos.
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